A terapêutica focal deve ser usada no cancro da próstata localizado?

Polémica entre urologistas da União Europeia e dos EUA. A terapêutica focal deve ser usada no cancro da próstata localizado?

A utilização da terapêutica focal com ultra-sons focados de alta intensidade (HIFU) foi recentemente contestada no tratamento do cancro da próstata localizado pelo urologista de Chicago, Gerald Chodak, no portal médico Medscape.

A polémica tem por base um estudo apresentado por urologistas europeus na sequência de   um estudo multicêntrico e prospectivo que relata o tratamento e avaliação de 625 homens durante 56 meses. No documento refere-se que a terapêutica em causa pode levar a um aumento da sobrevida global, a uma maior sobrevida livre de metástases e a uma maior sobrevida livre de recorrência da doença”.

Para o responsável norte-americano, no entanto, os autores do estudo europeu tomaram como adquirido que “o HIFU é eficaz no período de seguimento intermédio ou de médio prazo mediano, como forma de controlar o cancro da próstata localizado”. No entanto, acrescenta, “há várias questões que se podem levantar tendo por base a análise apresentada”.

Segundo Gerald Chodak, “cerca de 28% dos homens que participaram no estudo tinham doença de baixo risco e 55% dos homens tinham doença de Gleason 7 (3 + 4). Muitos deles seriam, pois, candidatos razoáveis ​​para vigilância ativa com baixo risco de recorrência”. Para o clinico norte-americano, “um relatório que é construído por uma maioria dos homens com essas características pode não ser uma prova da eficácia” da técnica em causa.

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Em segundo lugar, acrescenta, os colegas europeus não relataram os resultados da disfunção erétil, apesar de tais parâmetros terem sido avaliados na pesquisa. Segundo o urologista da Medscape, os resultados obtidos mostram “uma alta taxa de continência, com 20% dos homens que participaram no estudo a terem alguma quantidade de perdas, o que é pouco”.

Também o período de acompanhamento dos homens que participarem no estudo é posto em causa pelo urologista de Chicago: “Havia uma exigência segundo a qual os homens teriam, pelo menos, seis meses de acompanhamento e, embora a mediana fosse de 56 meses, parece que uma alta percentagem dos homens recebeu tratamento há menos de dois anos. Relatar qualquer coisa sobre esse curto período de tempo não ajuda a fornecer um forte apoio para se perceber a eficácia do tratamento”.

A terceira questão está relacionada com os resultados das biópsias. De acordo com Chodak, “25% dos homens que fizeram uma biópsia tinham doença recorrente e eram elegíveis para efectuarem um retratamento. É preocupante que muitos homens não tenham o seu cancro efetivamente controlado e erradicado. Assim, aos 5 anos, a probabilidade de não ter um tratamento repetido com HIFU foi de 78% para homens com doença de baixo risco, 79% para homens com doença de risco intermediário e apenas 69% para homens com doença de alto risco. Estes resultados não fornecem grande força para o valor dessa abordagem”.

Então qual o caminho a seguir? Para os clínicos da European Association of Urology e com base no que se sabe até agora, ”a terapia focal deve ser considerada um tratamento experimental”,  mas para Chodak “não há dados suficientes que comprovem que esta é uma forma eficaz de erradicar ou controlar a doença”.

Os autores europeus referem que a realização de um estudo prospectivo randomizado será bastante difícil de concretizar, como tem acontecido aliás com alguns dos outros tratamentos atualmente utilizados para o tratamento de doenças localizadas. .

No entanto, diz o urologista norte-americano, “este não pode ser o argumento para aceitar os resultados e tornar esta terapêutica alternativa razoável. Por enquanto, a defesa da utilização da terapêutica focal precisa de muito mais evidências. Resultados destes não fornecem grande confiança de que a HIFU representa uma mais-valia no tratamento do cancro da próstata localizado.

Dr. José Santos Dias

Director Clínico do Instituto da Próstata

  • Licenciado pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
  • Especialista em Urologia
  • Fellow do European Board of Urology
  • Autor dos livros "Tudo o que sempre quis saber Sobre Próstata", "Urologia fundamental na Prática Clínica", "Urologia em 10 minutos","Casos Clínicos de Urologia" e "Protocolos de Urgência em Urologia"

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